
No dia 18 de outubro, comemora-se o Dia do Médico. Para essa classe profissional, 2020 também foi um ano de superação e grandes desafios devido à pandemia do novo coronavírus. Os médicos precisaram reinventar a consulta médica por meio da telemedicina, desenvolvendo novas habilidades humanas e tecnológicas para continuar atendendo a seus pacientes mesmo com a obrigatoriedade do distanciamento social.
Em março, no início da pandemia, o Ministério da Saúde autorizou a telemedicina por meio da Portaria nº 467/2020, como uma medida excepcional e temporária para conter a contaminação com o novo coronavírus. Essa norma ficará em vigor até que cesse a situação de emergência em saúde pública causada pela Covid-19.
De acordo com a Portaria, os médicos podem realizar consultas, bem como emitir atestados e receitas médicas em meio eletrônico. Essas prescrições, vale lembrar, somente são válidas se assinadas eletronicamente por meio de certificados e chaves emitidos pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil). Como muitos pacientes não podem ficar sem atendimento médico, a consulta por meio remoto é uma alternativa neste momento de crise na saúde.
No entanto, a crença geral é de que a telemedicina veio para ficar. A portaria do MS foi um reforço à Resolução CFM nº 1.643/2002, a primeira no País a definir e disciplinar a prestação de serviços médicos por meio da telemedicina.
Pesquisa indica aceitação pela classe médica
Uma pesquisa realizada pela Associação Paulista de Medicina, em fevereiro deste ano, com 2.258 médicos brasileiros com o objetivo de avaliar a receptividade desses profissionais com relação às tecnologias digitais na área da Saúde, mostrou que, do total de respondentes, 90% acreditam que as novas tecnologias digitais podem ajudar a melhorar a saúde da população.
Para 89,81% dos pesquisados, o sistema público de saúde brasileiro pode ser beneficiado com novas ferramentas tecnológicas digitais capazes de diminuir as filas de espera por um atendimento especializado. E 70% acham que, com as tecnologias da telemedicina, o atendimento médico além do consultório poderia ser ampliado.
E foi. Logo após a publicação dessa pesquisa, o Brasil foi surpreendido com a pandemia do novo coronavírus. A telemedicina, que antes era uma possibilidade, foi a solução encontrada pelo Ministério da Saúde para manter as pessoas em casa e reduzir o índice de contaminação.
Desde o início da pandemia, mais de dois milhões de consultas online já foram feitas no Brasil via telemedicina, número quem vem aumentando a cada mês, segundo números apurados com a Associação Brasileira CIO Saúde (ABCIS).
“Acredito que não haverá retrocesso no atendimento por telemedicina, pois as inovações que surgem no mundo sempre aparecem embasadas em mecanismos que se propõe a ser solução ou facilitação de alguma rotina”, defende Carlos Camargo, médico cardiologista e CEO da Brasil Telemedicina, uma startup do setor.
Para o médico, a telemedicina ameniza as dificuldades de acesso à saúde em um País onde a distribuição geográfica da população médica é irregular: 60% dos médicos estão locados em apenas 42 cidades com mais de 500 mil habitantes e 2 mil das 5.587 cidades não têm médico de forma regular ou não os têm nunca.
“Quantas ambulâncias desses municípios viajam diariamente em busca desses profissionais em cidades de maior porte, muitas vezes percorrendo 200 a 300 km em busca de um especialista que, por meio da telemedicina, poderiam tê-los de forma organizada, com menor custo e risco de viagem”, pondera Camargo.
Atualmente, os segmentos da saúde perguntam-se se a telemedicina será mantida depois que a pandemia acabar, conforme determina a Portaria nº 467/2020, do MS. “Os hábitos adquiridos durante a pandemia serão mantidos, porque se pôde sentir a facilidade, objetividade e acessibilidade de uma orientação médica por meio remoto. Será um contrassenso antiético e desumano dificultar o acesso à saúde via telemedicina se não posso ofertar a todos em igualdade o atendimento presencial”, acrescenta Camargo.
A Brasil Telemedicina conta hoje com 1,5 mil médicos ativos no Médico24hs e 250 psicólogos. Segundo o CEO da startup, estão iniciando o cadastro de nutricionistas, fonoaudiólogos e fisioterapeutas, já ultrapassando a marca de 100 mil pacientes cadastrados.
O que mudou na relação médico-paciente com a telemedicina
A telemedicina trouxe muitos benefícios à relação médico-paciente. As centrais de monitoramento oferecem atendimento todos os dias da semana em horário integral sem que as pessoas precisem sair de suas casas, apenas quando for realmente necessário.
Praticamente todas as operadoras de planos de saúde, como Amil, Bradesco e Unimed, tiveram de criar plataformas e desenvolver tecnologias para consultas online quando se viram em meio à pandemia.
Muitas startups surgidas antes da pandemia, como Brasil Telemedicina e Dr. TIS, ganharam ainda mais relevância em 2020, enquanto outras surgiram no olho do furacão. É nas crises que nascem as soluções mais criativas.
No atendimento público, o SUS criou o Consultório Virtual da Saúde da Família, que passou a oferecer atendimento pré-clínico por telefone, chat online e WhatsApp para a população, serviço de acompanhamento e monitoramento remoto dos casos suspeitos de Covid-19 e suporte para os profissionais de saúde tirarem dúvidas por meio do 0800 644 6543. Não se sabe até que ponto essa medida foi de fato colocada em prática no sistema público de saúde.
Uma das grandes mudanças veio com a prescrição digital. De uma hora para outra, a receita deixou de ser em papel para ser eletrônica. Até mesmo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) precisou flexibilizar, por meio de nota técnica emitida no dia 2/3/2020, as regras para dispensação de medicamentos.
A Anvisa autorizou, também em caráter excepcional e temporário, o uso da prescrição digital para Receitas de Controle Especial, utilizadas para medicamentos que contenham substâncias da Lista C1 e C5 e dos adendos das Listas A1, A2 e B1 da Portaria SVS/MS nº 344/98, desde que também sejam atendidas todas as exigências previstas na legislação sanitária. Além disso, a assinatura digital também pode ser aplicável à prescrição de medicamentos antimicrobianos.
De acordo com Jihan Zogbi, CEO da Dr. Tis, uma startup de telemedicina, e presidente da ABCIS, o importante é trabalhar em uma plataforma segura, que garanta a assinatura digital. “No início, era um conceito bem novo, mas com o tempo apareceram plataformas boas. Se a plataforma tem integração com a certificação digital ICP-Brasil, basta imprimir em PDF”, diz Jihan.
Leia também: 5 dicas valiosas de gestão hospitalar
Como se garante a qualidade do atendimento remoto
Desde sempre e principalmente durante a pandemia, a telemedicina garantiu acesso à prevenção primária, atendimentos de pequena e média complexidade, gestão da saúde por meio do monitoramento de dados colhidos dos pacientes em suas casas ou em viagem e proatividade direta por parte do paciente no controle de sintomas ou sinais que poderiam significar uma piora do quadro de saúde. Tudo isso contribuiu com o desafio dos governos de elevar os índices de isolamento social.
Mas como se garante um atendimento médico de qualidade por meio remoto? “Para isso, devemos entender que a telemedicina tem limitações para abordagem dos pacientes em teleconsulta e que jamais devemos ultrapassar esses limites. Os médicos têm conhecimento de que a medicina está completamente mapeada com protocolos de ação para cada patologia, os quais, quando seguidos, levarão sempre a excelentes resultados”, observa Camargo.
O primeiro passo é fazer um curso para se familiarizar com todos os recursos e ferramentas do ambiente online. Em seguida, garantir que a estrutura esteja adequada, o que passa por um bom sinal de internet e pela aquisição de equipamentos como câmera e microfone, para conseguir ver e conversar com o paciente com clareza e sem ruídos. Esse é o ambiente ideal, porém muitos médicos estão realizando suas consultas por aplicativos de mensagens, como o WhatsApp, o mais popular de todos.
“A qualidade pode ser garantida por meio do uso de plataformas seguras, que propõem, tanto para o paciente quanto para o médico, boa usabilidade e troca de informações. Médico e paciente devem conseguir compartilhar pedidos de exames e resultados. O médico, por sua vez, precisa de uma ferramenta onde possa registar o prontuário do paciente e emitir receita digital, de forma segura e rápida”, acrescenta Jihan.
Segundo ela, no início da pandemia, muitos médicos tiveram dificuldades para utilizar as plataformas disponíveis, mas isso deixou de ser um fator preocupante. Atualmente, a maioria usa sem qualquer problema. O principal entrave é o sinal fraco de internet em muitas regiões do Brasil.
Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no dia 18/9/2020, a principal preocupação agora é garantir o sigilo dos dados dos pacientes nas mais diversas plataformas de teleconsulta e emissão de prescrição digital, mas isso é tema para outro artigo.
Veja também: Aprenda Com Quem Faz: Marise Nascimento